6 years ago
A busca pela felicidade parece ser um desejo intrínseco que acompanha o ser humano por toda a vida. Por ser algo tão desejável, foi discutida, estudada, dissecada através dos tempos por pensadores como Sócrates, Aristóteles, Epicuro, Kant, pelas diferentes religiões do mundo.
E por que, mesmo após tantos anos de investigação, não se tem uma resposta definitiva? Como é possível que o homem tenha chegado a entender mecanismos tão vitais como o funcionamento de uma célula e que consiga prever o movimento de astros a anos-luz de distância, e não tenha conseguido erradicar a depressão? Será que a resposta é tão complexa que não conseguimos formulá-la?
Observemos a vida do João. João nasceu e chorava quando sentia algum desprazer como fome, frio e dor física. Assim, a felicidade para João era algo extremamente simples e atingível. À medida que João foi crescendo, essas necessidades mais básicas e primitivas foram se associando a outras. João parava de chorar apenas ao ser pegado no colo pela mãe. Não tinha fome, não tinha nada. Mas era bom estar no colo dela. João nasceu precisando apenas de leite e calor. Agora ele precisa da mãe também. Da mãe, do resto da família, dos amigos. Antes ele precisava apenas de comida e casa, depois precisou de dinheiro, de cartão de crédito, de emprego, de estudo, de carro. Assim, ele foi criando conexões onde antes não existia e evoluindo para necessidades maiores que antes não existiam. Isso aconteceu porque, da necessidade da mãe, ele subiu mais um degrau, generalizou, e percebeu que as pessoas próximas a ele provinham comida e conforto quando precisava, logo, fazer parte de um grupo não era má idéia.
Chegou uma hora em que João já tinha se habituado a ter comida e proteção abundantes (pois o grupo/família provinha) e como ele foi crescendo e aprendendo novas coisas, João cresceu em complexidade, além de tamanho, começou a ter novas necessidades, umas úteis outras nem tanto. “A gente não quer só comida” e é por isso que queremos ficar brincando um pouco mais quando a mãe chama para a janta. Ao brincar, João fortaleceu o relacionamento com o grupo, e isso trazia uma sensação muito gostosa de sentir, semelhante à de quando estava com fome, e tinha leite disponível. Com 5 anos, João fez um escarcéu porque queria ter os brinquedos legais que os amigos tinham. Com 7 anos, ficou no pé do pai até aprender a ver as horas, pois todos já sabiam. E aprender era tão maravilhoso! João queria que os adultos vissem as suas conquistas, notassem o que ele tinha aprendido a fazer. Aos 10 anos, sonhou em ser o melhor jogador de futebol da escola, e treinou muito para isso. Já tinha aprendido que fazer gol trazia muitas coisas legais, o aplauso da torcida, o sorriso dos pais, os amigos mais legais. E junto com isso, vinha um sentimento muito gostoso que ele nem sabia explicar. Mas ele queria senti-lo todo dia! Depois de um tempo, conquistar coisas, já era gostoso por si só. Não precisava mais dos aplausos e dos sorrisos. Tanto que jogar vídeo game era gostoso, mesmo sozinho.
Quando João era criança, ele sabia o que o deixava feliz! João viveu uma infância muito boa. Teve muitas das coisas que quis. Aprendeu com a vida, que os outros seres humanos que fizeram parte de sua vida, eram pessoas confiáveis, se fizesse como eles faziam, seria feliz sempre. E sem saber, aprendeu a copiar. E virou um excelente copiador!
Fez certa faculdade porque era o que dava dinheiro. Comprou um carro novo quando o vizinho comprou. Casou-se porque já namorava há quatro anos. E num dia, insone, se perguntou porque que não estava feliz. Fez tudo o que tinha que fazer, mas aquela sensação gostosa, que chamavam felicidade, antes duradoura, agora, as raras vezes que sentia, passava rápido e logo evaporava. Roberto, seu colega, parecia tão melhor do que ele, em tantos aspectos… chegou a comprar o mesmo livro que viu sobre a mesa de Roberto “10 passos para uma vida feliz”, mas a fórmula não funcionou com ele. Pensava: “Tanta gente passa fome, tanta gente desempregada e doente… e eu, jovem e saudável, me sinto velho e fraco”.
Um dia João e sua esposa resolveram plantar um jardim no quintal de casa. Era uma tarefa simples, João queria mais era terminar logo e ir assistir ao jogo na TV. Mas João vivenciou algo inesperado, que ele nunca esperaria de uma atividade tão simples e fácil. Enquanto estava no jardim, o tempo passava e ele nem via. Cuidar do jardim com a esposa, era gostoso como brincar na rua. Não sentia fome, não vinha preocupação na cabeça enquanto ele estava lá. As flores que plantava pareciam-lhe ter mais beleza do que quando comprava na floricultura. Quando os amigos o visitavam e elogiavam o jardim, era como fazer o gol, o sorriso vinha fácil.
João, inteligente como era, já foi pensando em outras coisas que deveriam ser gostosas, e ficou viciado nessa busca. Aos 30 anos, andou de skate, aprendeu a tocar piano, fez curso de culinária, surfou, pedalou, pulou de pára-quedas, fez aquela viagem de mochilão com a mulher. Qualquer esforço valia a pena para repetir aquela sensação. Percebeu que se sentia extasiado ao fazer coisas. A sensação não chegava antes ou depois, mas na hora certa em que estava fazendo as coisas, realizando, construindo. Simplesmente fazendo! Leu que era a tal da endorfina, o hormônio do prazer. Era responsável pela sensação gostosa que ele sentia ao fazer algumas coisas. Era ela o tempo todo, e ele nem sabia! Quando brincava com os amigos, quando aprendeu a ver as horas, quando fazia os gols, quando jogava vídeo game. Era só fazer essas coisas, e ela estava lá! Nada poderia tirar seu humor, a saúde melhorou, a insônia acabou. Até o sexo com a esposa melhorou!
Depois de um tempo, notou que a sensação gostosa vinha com mais intensidade ao fazer coisas novas! Repetir o que já sabia fazer sempre do mesmo jeito, era como copiar os outros… era bom por um tempo. Mas só por um tempo.
Descobriu também outra coisa: ser útil às outras pessoas era bom também! Nos finais de semana, saía na rua e ensinava às crianças as melhores jogadas de futebol que tinha aprendido na idade delas. Pagou um almoço para um rapaz que pedia no semáforo e, imaginando a alegria do rapaz, sentiu-se feliz por isso, como se ele mesmo fosse por um segundo o rapaz.
O que João aprendeu com a vida, foi que a felicidade é feita por momentos, momentos nos quais se faz coisas e não ficamos esperando as coisas acontecerem. Apenas nós mesmos somos capazes de fazer a felicidade. Ganhar é bom, mas conquistar é melhor ainda!
A nossa ciência do comportamento é uma ferramenta capaz de nos ajudar a entender quais são as coisas que podemos fazer para atingir esses momentos, que devem ser para todos nós. Todos querem viver uma vida recheada de conquistas, realizações e momentos marcantes. Uma vida bem vivida.
Fernanda Cardoso Fraga Fonseca, psicóloga da equipe INTERAC